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sábado, 5 de dezembro de 2009

Há mais meninas no Sapo Codebits

"Estamos a começar a distribuir comida, pizza e saladas no Codebits". Não, este aviso não é feito através de uma instalação de som na Cordoaria Nacional, em Lisboa, onde está a decorrer desde quinta-feira a terceira edição do Sapo Codebits, considerada a "maior montra de talentos nacionais e internacionais na área da programação informática". A informação é enviada através do Twitter e surge nos telemóveis ou nos computadores portáteis dos participantes que seguem o Codebits, onde recebem mensagens de 140 caracteres sobre o que ali se está a passar.


A maioria das raparigas agarradas aos computadores passou ou estuda na Universidade de Aveiro. Fabienne e Maria Miguel não são excepções.


Então os geeks - muitos rapazes, pouquíssimas raparigas - sentados desde manhã nas 70 mesas redondas espalhadas ao longo da Cordoaria Nacional levantam a cabeça, tiram as mãos do teclado e pensam em comida.

No Sapo Codebits, além de se poder assistir a vários workshops (completamente indecifráveis para quem não for da área e não souber programação informática), pode-se participar no concurso que ao longo de 24 horas consecutivas permite aos participantes terem uma ideia, desenvolvê-la e apresentá-la depois em 90 segundos na sessão final, que se realiza hoje. Aqueles que forem considerados os dez melhores projectos serão apoiados e concretizados com ajuda financeira e recursos do Sapo. É essa a graça da coisa: networking (conhecer pessoas com os mesmos interesses, trabalhar em rede e encontrar parceiros).

A Cordoaria Nacional foi preparada especialmente para os três dias de "talento e divertimento". O recinto é tão grande que a equipa de produção optou por utilizar bicicletas para se deslocar. Nas janelas foram colocados painéis brancos para que não entrasse luz (fica aquela sensação de não se saber se é de noite ou de dia) e foi dado a cada participante um pequeno candeeiro para colocar no teclado. Como há quem faça directas ou até durma por lá, também receberam uma bolsa com o que costumam dar nas viagens de avião em executiva (meias, almofada, etc.).

Os organizadores receberam 1500 inscrições, seleccionaram 650 participantes e Celso Martinho, director de tecnologia de produto no Sapo e um dos seus fundadores, explica que foi graças ao currículo e ao portfólio que escolheram os que lhes pareceram ter o perfil mais adequado - os que mostraram iniciativa, motivação e já estavam envolvidos nas tecnologias da Internet. Pela primeira vez 50 mulheres foram seleccionadas (no ano passado só eram dez). "É bom ver que existe mais envolvimento, mas não quisemos fazer alarido. O Codebits não é só para programadores, engloba várias áreas de criatividade, abrimos o espectro."

A maioria das raparigas agarradas aos computadores passou ou estuda na Universidade de Aveiro (UA). É o caso de Maria Miguel, 21 anos, que se licenciou em Aveiro e agora está a fazer o mestrado em Design e Multimédia em Coimbra. Ela e Fabienne Pimenta, 19 anos, do curso Novas Tecnologias da Comunicação da UA, estão sentadas sozinhas numa mesa a pensar no projecto que irão apresentar. "Vai puxar um bocadinho para a arte computacional, mas ainda está em estado embrionário", diz Maria a rir-se. Só sabem que vai envolver linguagem processing (que permite fazer interacção com um computador com uma webcam). No ano passado alguém fez um projecto em que se conseguia jogar pingue-pongue com a cabeça interagindo com uma câmara.

Rede de solidariedade

Muito mais avançado está o projecto de Susana Coelho, 29 anos, uma repetente no Codebits. No ano anterior concorreu com o projecto iGive, uma rede social de solidariedade, e acabou por estagiar no Sapo, onde é Web designer. Na altura não arranjou programador para a ajudar e apresentou o projecto sozinha, mas entretanto, com um colega no Sapo, o programador André Luís, concretizou o iGive (igive.sapo.pt).

Se temos uma coisa que já não nos faz falta pode haver alguém que esteja a precisar dela. É esta a ideia base do iGive, que ajuda as pessoas a dar o que já não precisam e a encontrar o que procuram. É muito fácil, cria-se um perfil e assim se dá e se recebe. Depois as entregas dos objectos são feitas (pelo correio, pessoalmente...). O site só controla - através de um código que atribui aos objectos trocados/oferecidos - que a entrega se efectuou.

Susana Coelho ainda ouviu de alguns rapazes que o seu projecto era "lamechas" e que pertence ao "mundo dos sonhos" e das boas intenções. Mas ela, determinada, foi em frente. "Quis mostrar que as novas tecnologias e a Web nos podem aproximar e podem humanizar as nossas vidas", diz.

Parecia que todas as mulheres com quem falávamos no Codebits eram Web designers, até encontrarmos Teresa Barros, 36 anos, programadora que trabalha no Sapo. Tirou o curso de Gestão e Engenharia Industrial no Porto e fez o mestrado em Tecnologia e Multimédia. "Como fui para Engenharia, desde os 15 anos que era sempre a única rapariga da turma. O que aconteceu depois também um pouco por todos os sítios onde trabalhei", explica. No Sapo Codebits, com a sua equipa de cinco pessoas está a apresentar o portal de Widgets do Sapo (widgets.sapo.pt), onde se pode criar uma página e colocar e organizar todos os Widgets preferidos (pequena aplicação que tanto pode ser uma calculadora como um agregador de notícias). Teresa conta que nesta sua profissão ainda há preconceitos. "Quando vêem uma programadora mulher acham sempre que é inferior. Como há poucas, se conheceram duas que são más, generalizam e pensam que todas são péssimas. Precisamos de nos esforçar mais."

Quando se está muito tempo entre homens e eles nos começam a confundir com homens, "ficamos com uma visão diferente do sexo oposto", diz. Às vezes, os colegas esquecem-se que à sua frente está uma mulher. "Dizem "nós, os homens" ou contam as manhas que fazem em casa, por exemplo, para escapar às tarefas domésticas, como se o interlocutor à frente deles não fosse feminino." Para escapar a isso e por serem mulheres a trabalhar num mundo de homens, Teresa Barros e a sua colega Ana Godinho, gestora de produto que está sentada ao pé dela nesta Codebits, têm há anos o blogue O Interno Feminino, com divagações e reflexões do mundo no feminino. Onde menino não entra.


-Público (Isabel Coutinho)

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